sexta-feira, 22 de maio de 2015


Daniela Mercury e esposa participam de seminário LGBT na Câmara

Evento é organizado por deputados ligados à temática dos direitos humanos como Jean Wyllys (PSOL-RJ) e Erika Kokay (PT-DF). Deputados reclamam de "censura" na Casa

Postadoem 20/05/2015 12:26 / atualizado em 20/05/2015 12:48





Jean Wyllys/Divulgação

Daniela e a esposa, a jornalista Malu Verçosa


Começou há pouco o XII Seminário LGBT da Câmara dos Deputados. O evento foi aberto pela cantora baiana Daniela Mercury, que executou o Hino Nacional. Ela participa da mesa de abertura do seminário acompanhada pela esposa, a jornalista Malu Verçosa. Organizado por parlamentares ligados ao tema dos Direitos Humanos, o seminário teria enfrentado resistência por parte do atual presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de acordo com os organizadores.

Pelas redes sociais, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) disse que a Câmara se recusou a imprimir convites e distribuir e-mails com convites para o seminário, pelos canais institucionais. A colagem dos cartazes do seminário, que estampam um beijo entre Daniela e a companheira, também teria sido vetada dentro da Casa. Formalmente, o seminário é sediado pela Comissão de Legislação Participativa (CLP), ao contrário do que geralmente ocorre. “Vamos tentar aprovar hoje à tarde o requerimento na Comissão de Direitos Humanos. De dezoito deputados, uns treze são fundamentalistas”, disse a deputada Erika Kokay (PT-DF), que participa da organização do seminário. 

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“O próprio presidente dessa Casa (Cunha) tem se comportado dessa maneira. Ele fez uma articulação política que promove o ódio. Não só na forma como ele pauta os projetos aqui dentro, mas também na forma como ele age fora daqui”, disse Wyllys. Na fala de abertura, Wyllys exibiu trechos de um vídeo em que Cunha atribui a ele e a Erika a autoria de um projeto que supostamente “permite às crianças mudar de sexo sem a autorização dos pais”, durante uma conversa com estudantes. 

Também participam da mesa de abertura o coordenador-residente da ONU no Brasil, Jorge Chediek; o presidente da Comissão de Legislação Participativa, Fábio Ramalho (PV-MG); e Weykman e Rogério Kosckek, um dos primeiros casais LGBT a obter na justiça brasileira o direito de adotar filhos. Países Baixos, Dinamarca e Bélgica e Finlândia também enviaram os embaixadores ao evento. O seminário segue ao longo da tarde desta quarta (20/5) e durante a quinta-feira (21/5), no auditório Nereu Ramos da Câmara. A entrada é livre.
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Lava Jato: lobista é preso e irmão é levado para depor na PF

O lobista Milton Pascowitch, apontado como operador de propinas da empreiteira Engevix na Diretoria de Serviços da Petrobras, foi preso preventivamente na manhã desta quinta-feira, 21, em nova fase da Operação Lava Jato. O irmão de Milton, José Adolfo Pascowitch, foi levado coercitivamente para depor na Polícia Federal.
Foram feitas busca e apreensão na casa dos irmãos e também na casa de Henry Hoyer de Carvalho. Hoyer é apontado como operador do PP.
A PF deflagrou na manhã desta quinta-feira a 13ª fase da Operação Lava Jato que tem como alvo fatos relacionados a dois operadores financeiros que atuavam junto a contratos firmados por empreiteiras com a Petrobras. Estão sendo cumpridos oito mandados judiciais, quatro de busca e apreensão, um deles no município de Itanhandu/MG e os demais no Rio de Janeiro (1) e São Paulo (2).
Dez lobistas são apontados como operadores de propinas no esquema de corrupção instalado na Petrobras e desbaratado pela Operação Lava Jato. Os nomes foram indicados pelo ex-gerente executivo Pedro Barusco, que foi braço direito do ex-diretor de Serviços da empresa Renato Duque, em sua delação premiada.
Barusco admitiu ter atuado com Milton Pascowitch. Ele o apontou como operador financeiro da empresa Engevix e do Estaleiro Rio Grande, efetuando transferências de offshore para contas do ex-gerente. Pascowitch se identificou como representante da Engevix, e entrou 60 vezes na Petrobras. Os dez lobistas visitaram a estatal petrolífera pelo menos 1.800 vezes entre 2000 e 2014.






Lobista pagou R$ 1,15 milhão para Dirceu durante julgamento do mensalão

A força-tarefa da Operação Lava Jato descobriu que o lobista Milton Pascowitch repassou R$ 1,15 milhão para a empresa JD Assessoria e Consultoria, de José Dirceu, no ano de 2012, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) julgava o processo do mensalão, no qual a Procuradoria-Geral da República acusava por corrupção o ex-ministro da Casa Civil do governo Lula.
Para o juiz Sérgio Moro, que mandou prender Pascowitch nesta quinta-feira, 21, este pagamento "coloca em dúvida" se de fato a empresa de Dirceu recebeu de Pascowitch por "serviços de consultoria".

Ao todo, a força-tarefa identificou pagamento de R$ 1,45 milhão de Pascowitch para a empresa de Dirceu - portanto, o maior volume chegou ao caixa da empresa de Dirceu justamente durante o julgamento do mensalão.
"Merecem igualmente destaque pagamentos de R$ 1.457.954,70 entre 2011 e 2012 à empresa JD Assessoria e Consultoria Ltda., de titularidade de José Dirceu de Oliveira e Silva, ex-ministro-chefe da Casa Civil e liderança do Partido dos Trabalhadores, depois condenado criminalmente pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal na Ação Penal 470", anotou o juiz Moro.

Para ele, "causa certa surpresa que, deste valor, R$ 1.157.954,70 tenham sido pagos durante o ano de 2012, quando o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgava, na Ação Penal 470, a acusação formulada pelo Procurador Geral da República contra José Dirceu, o que coloca em dúvida se poderiam ter por causa prestação de serviços de consultoria."



Lobista preso na Lava Jato é alvo central de apuração que envolve Dirceu e PT



(Foto: Estadão Conteúdo)

(Foto: Estadão Conteúdo)

O lobista da construtora Engevix Milton Pascowitch, preso na manhã desta quinta-feira, 21, na 13ª fase da Operação Lava Jato, é o alvo central das investigações envolvendo o suposto recebimento de propinas pelo ex-ministro José Dirceu, pelo ex-diretor de Serviços da Petrobras e o PT. Pascowitch pagou R$ 1,4 milhão ao ex-ministro José Dirceu e R$ 1,2 milhão para o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque - também preso, desde 16 de março, envolvido no escândalo de corrupção e cartel na estatal.

A Jamp pagou a JD Assessoria e Consultoria Ltda., do ex-ministro José Dirceu, em 2011 e 2012. O ex-ministro alegou que foi por serviços de consultoria internacional prestados para a construtora Engevix Engenharia, em Cuba e no Peru.

Para os investigadores da Lava Jato, a Jamp era uma empresa de fachada de Pascowitch usada para esquentar o dinheiro da propina. Não há aparente relação justificável para a relação comercial formal entre as partes, acreditam os procuradores.

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O que reforça a suspeita é o depoimento de um dos sócios da Engevix, Gérson de Mello Almada, no dia 18 de março. O vice-presidente da empreiteira confessou ter pago por serviços de "lobby" ao operador de propina, como forma de garantir seus contratos na Petrobras.

Pascowitch seria um abridor de portas na estatal, graças aos seus contatos com membros do PT, entre eles o tesoureiro do partido João Vaccari Neto. O que chamou a atenção dos investigadores foi que Almada admitiu ter contrato as consultorias internacionais da JD para abrir mercado em Cuba e no Peru, mas disse desconhecer a relação comercial entre Jamp e a empresa do ex-ministro - conforme justificou Dirceu em nota oficial à imprensa, um dia depois.

A JD nega qualquer irregularidade e diz que os contratos foram legais. Jamp e a própria Engevix pagaram juntas R$ 2,6 milhões ao ex-ministro José Dirceu - também por serviços de consultoria, entre 2008 e 2012.

DuqueNa casa de Duque, no Rio, a Polícia Federal já havia encontrado contrato de consultoria da D3TM Consultoria e Participação, empresa de Duque, com a Jamp Engenheiros Associados, de 2013, no valor de R$ 1,2 milhão.

"(A D3TM) A empresa era fachada do ex-diretor para receber propina de quando ele era ex-diretor da Petrobras, que continuou até 2014", afirmou o procurador da República Carlos Fernando Lima, um dos coordenadores da força-tarefa da Lava Jato, em entrevista coletiva, na manhã desta quinta-feira, em Curitiba.

A própria Engevix, também contratou os serviços de consultoria do ex-diretor de Serviços em 2014, segundo comprovam contratos e notas apreendidas nas buscas feitas pela PF.

Duque está preso desde o dia 16, depois que foi deflagrada a Operação Que País é Esse - décima fase da Lava Jato. Pelo menos 11 notas fiscais apreendidas mostram pagamentos mensais da Jamp de R$ 100 mil para a D3TM entre maio de 2013 e abril de 2014, quando Duque comunicou que não poderia mais cumprir seu contrato. O documento de encerramento da parceria foi encontrado também.

Além da Jamp, a D3TM foi contratada também por outras empreiteiras acusadas de cartel e corrupção na Petrobras, como a UTC, a OAS e a Iesa. O ex-diretor de Serviço - principal alvo da Lava Jato no esquema de corrupção da estatal - era indicado do PT e ocupou o cargo entre 2003 e 2012. Ele nega qualquer irregularidade envolvendo os contratos da estatal. Preso pela primeira vez em 14 de novembro, foi solto dias depois por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).




Juiz Sérgio Moro aponta 'corrupção sistêmica'

O juiz federal Sérgio Moro disse que a Operação Lava Jato "tem cotidianamente se deparado com um quadro de corrupção e lavagem de dinheiro sistêmicas". Ao mandar prender o lobista Milton Pascowitch, que pagou R$ 1,45 milhão para uma empresa de consultoria do ex-ministro José Dirceu (Casa Civil do governo Lula), o juiz assinalou que a investigação revela "indícios da prática sistemática e habitual de crimes de cartel, de fraude à licitação, de corrupção e de lavagem de dinheiro".

Milton Pascowitch foi preso em São Paulo nesta quinta-feira, 21, na 13.ª etapa da Lava Jato. A Polícia Federal e a Procuradoria da República suspeitam que Pascowitch fazia lobby para o PT e repassava dinheiro ilícito para empresas de Dirceu.

"A gravidade concreta da conduta de Milton Pascowitch é ainda mais especial, pois há indícios de que propinas também foram pagas, por seu intermédio, para agentes políticos e para financiamento político, o que compromete a integridade do sistema político e o regular funcionamento da democracia", destacou o juiz da Lava Jato.

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Para Moro, "o mundo do crime não pode contaminar o sistema político-partidário". O juiz argumenta que a participação de Pascowitch "é mais análoga a dos profissionais que se dedicaram, diferentemente dos empreiteiros, exclusivamente à prática delitiva, intermediando propinas, ocultando e dissimulando o produto do crime, em operações complexas de lavagem de dinheiro, inclusive com transações e contas secretas no exterior". 

Moro cita depoimento do empreiteiro Gerson de Mello Almada, segundo o qual a função de Pascowitch "era equivalente" a do doleiro Alberto Youssef - peça central da Lava Jato. "Ou seja, profissional dedicado ao pagamento de propina e de lavagem de dinheiro", afirma o juiz que vê aí, a necessidade da prisão preventiva do lobista ante "a presença do risco à ordem pública".

O juiz ressalta a existência de materialidade dos crimes atribuídos ao pagador de José Dirceu e o risco de Pascowith destruir ou ocultar provas. "No caso de Milton Pascowitch há provas de que manteria contas secretas no exterior (pelo menos a MJP International Group e a Farallon Investing Ltd), com recursos milionários, a partir das quais efetuou o pagamento de propinas a empregados públicos, como Pedro Barusco (ex-gerente de Engenharia da Petrobras que devolveu US$ 97 milhões recebidos em propinas). 

As contas secretas ainda constituem indício de risco à aplicação da lei penal, pois não sendo imediatamente acessíveis às autoridades brasileiras, tem o investigado condição de dissipar os ativos nelas mantidos, impedindo, com eficácia, a recuperação do produto do crime, oferecendo ainda um risco concreto de fuga, pois, com conexões e recursos milionários no exterior, tem o investigado condições de nele refugiar-se, mantendo-se a salvo da ação da Justiça brasileira."

"Milton Pascowitch teria participado por longo período do esquema criminoso, sendo apontado como intermediador das propinas de 2004 a 2014 entre dirigentes da Engevix e empregados da Petrobras e da Sete Brasil, além de haver indícios de que atendeu outras empreiteiras", assinala o juiz na decisão que deflagrou a 13.ª fase da Lava Jato.

Para Sérgio Moro, "em um contexto de criminalidade desenvolvida de forma habitual, profissional e sofisticada, não há como não reconhecer a presença de risco à ordem pública, a justificar a prisão preventiva para interromper o ciclo delitivo".


quinta-feira, 14 de maio de 2015



A falácia da 'freada de arrumação'

Quando até o FMI faz autocrítica da austeridade, a tentativa de reproduzir o estratagema lulista sinaliza que o governo perdeu o rumo da mudança.

08/05/2015 - Copyleft

Leda Maria Paulani
Marcelo Camargo / ABr
No ambiente conturbado em que transcorreu o segundo turno das eleições presidenciais de 2014, escrevi um pequeno artigo para o site Carta Maior intitulado “Terrorismo Econômico”. Argumentei ali que o clima que o país vivia assemelhava-se muito ao clima existente 12 anos antes, em 2002, quando se colocava claramente a possibilidade de Lula chegar à presidência da República, na disputa com José Serra, do PSDB. Lembrei que como isso não era então do agrado das forças financeiras que haviam protagonizado os dois mandatos de FHC, instalara-se um clima de terror, que operava em todas as frentes, da mídia aos agentes do mercado, das análises “científicas” dos doutores das universidades às peripécias internas do próprio Banco Central. Assim, mesmo com a Carta aos Brasileiros em que Lula prometia continuar a política econômica em curso e os juros elevados que irrigavam os ativos dos credores, a ideia de que a economia iria se desfazer como gelatina e “sair do controle” na hipótese de Lula vencer, foi se disseminando com força. Observei, na sequência, que, se não havia naquela época razão para tamanho alarde, muito menos havia no final de 2014, com a economia brasileira apresentando parâmetros macroeconômicos muito melhores que em 2002. Depois de percorrer alguns desses parâmetros, inclusive com comparações internacionais, mostrei que o terrorismo se explicava pelo absoluto horror que os mercados financeiros tinham da candidata Dilma Rousseff, horror justificado pelo progressivo afastamento da ortodoxia econômica levado a efeito pelo governo da presidenta e pela coragem que ela então tivera de afrontar os interesses financeiros, retirando Meirelles da presidência do Bacen, baixando a taxa de juros e utilizando os bancos públicos para forçar a redução dos vergonhosos spreads bancários praticados no país. Concluí por fim com a esperança de que, diferentemente do que ocorrera em 2002, quando o terrorismo fora funcional mesmo após as eleições, levando o governo recém-eleito, supostamente de esquerda, a beijar a cruz do neoliberalismo, desta vez, a política econômica se libertasse de vez dos ditames da ortodoxia e retomasse o enfrentamento dos interesses financeiros, tão lesivos aos interesses da maioria da população.  
A capitulação do terrorismo econômico
 
Mesmo antes de o calendário mostrar o início do segundo mandato da presidenta, já estava clara a frustração dessa esperança. Embaralhado com a comoção causada pelas revelações de esquemas de corrupção na Petrobrás, o terrorismo foi e está sendo mais funcional do que nunca. Os interesses financeiros, além de “produzirem”, nas estripulias cotidianas dos mercados, os resultados ruins que alardeiam, fizeram o ministro da Fazenda, e vêm sendo muito bem-sucedidos, com o auxílio de sempre da mídia, em demonstrar que a política de austeridade proposta é a única saída para o país. Vendida como remédio amargo que a sociedade tem de engolir para voltar a crescer, sua defesa vem acompanhada do discurso de sempre, com sabor de sermão dominical, de que esquecemos a lição de casa, demos o passo maior que a perna (muito gasto em programas sociais, em incentivos econômicos...), perdemos, enfim, a credibilidade. Assim, uma “freada de arrumação” tornar-se-ia indispensável para “pôr ordem na casa” e retomar o crescimento.
 
Sem entrar neste texto na discussão sobre as razões dessa rendição total do segundo período da presidenta a esse discurso, investiguemos os dados. A principal razão da gritaria dos mercados é o resultado das contas públicas. Pela primeira vez, desde 2002, esse resultado, em 2014, foi negativo em R$ 32,5 bilhões, ou 0,59% do PIB. Em 2013, por exemplo, fora positivo em R$ 91,3 bilhões, ou 1,8% do PIB. Qual a importância desse dado, ou seja, por que os mercados mostram-se tão interessados nele? O interesse está em que a existência do assim chamado superávit primário é um indicador da economia de recursos feita pelo governo e destinada ao pagamento do serviço dessa dívida. Daí serem as contas públicas mensuradas pelo conceito primário, ou seja, sem incluir no cômputo das despesas os gastos relativos aos juros que têm de ser pagos aos credores do Estado, que são os agentes que carregam em seus portfólios de ativos os títulos governamentais. Se o superávit primário não existe, pior, se o resultado primário é negativo, isso significa que é preciso um aumento do endividamento público para que o governo obtenha os recursos necessários para o enfrentamento dessas despesas.
 
Do ponto de vista da dívida pública propriamente dita, o indicador que os mercados utilizam para fazer suas avaliações é a relação dívida/PIB. Nos últimos 8 anos, medida em termos brutos (ou seja, sem descontar as reservas cambiais e os títulos públicos à disposição do Banco Central), essa relação no Brasil ficou na média dos 57%. Isso é muito ou é pouco?  Quando olhamos os dados dos países mais desenvolvidos, percebemos o quanto de histeria interessada há na afirmação de um descalabro das contas públicas e da necessidade de uma “freada de arrumação”. Essa mesma relação é em média de cerca de 90% nos países da zona do euro, Reino Unido e Canadá, de 100% nos EUA e de 230% (isso mesmo, 230%!) no Japão. Isto posto, qual é a tragédia se essa relação tiver de crescer por força do resultado primário negativo de 2014?  
 
Uma outra questão é perguntar pela efetividade da política de gastos em seu objetivo de manter o crescimento, o emprego e a renda, questão complicada, como sabemos, pelos resultados ruins em termos de produto que foram obtidos (crescimento de apenas 0,1% em 2014), mas esse é outro problema. O que nos interessa aqui, por ora, é defender o princípio da intervenção do Estado para a manutenção do emprego e da renda, mesmo que isso implique a necessidade de uma elevação na relação dívida/PIB. Não é demais também relembrar que esses dados de dívida referem-se ao conceito bruto, ou seja, sem que se deduza daí a dívida implícita no carregamento dos quase 400 bilhões de dólares de reservas internacionais que o país hoje possui e os títulos públicos na carteira do BC. Isso considerado, ou seja, tomando-se a dívida em seu conceito líquido, a relação dívida/PIB cai para a esfera dos 34%, o que torna ainda mais disparatado o barulho em torno do pequeno resultado primário negativo de 2014.
 
Outros dados poderiam ser analisados, como aqueles referentes à questão inflacionária ou ao déficit nominal em relação ao PIB, levando à mesma conclusão, ou seja, de um overshooting deliberado de apreciação negativa da situação econômica do país (em suma, terrorismo econômico) com o objetivo exclusivo de apresentar as políticas de austeridade como a única saída possível. Analisando a situação de forma objetiva e sem a presença de interesses econômicos disfarçados de avaliação científica, o país enfrenta hoje, de fato, do ponto de vista macroeconômico, dois problemas graves, cuja natureza, porém, difere bastante, seja em termos de dinâmica, seja em termos de timing, do descalabro econômico que povoa as análises ortodoxas reproduzidas incansavelmente pela mídia. Vejamos quais são eles e se a “freada de arrumação” poderá resolvê-los.
 
Quais são os verdadeiros problemas?
 
O primeiro problema realmente sério é o resultado das contas externas. O déficit de transações correntes do Balanço de Pagamentos ultrapassou os 90 bilhões de dólares em 2014. É verdade que esse resultado é historicamente negativo por força dos volumosos pagamentos de juros, lucros e dividendos que caracterizam a economia brasileira. Assim, mesmo nos períodos em que a balança comercial alcança resultados muito positivos, o resultado total das contas correntes é quase sempre negativo, ou, na melhor das hipóteses, apenas ligeiramente positivo. Contudo, a magnitude que esses resultados negativos vêm alcançando de 2010 para cá, indo para a esfera dos quase 100 bilhões de dólares anuais, é realmente preocupante. Isso significa, sob pena de vermos nossas reservas minguarem em pouco tempo, que necessitaremos crucialmente de resultados de magnitude semelhante na Conta Financeira, resultados que dependem da disposição dos agentes externos de investirem no país, ou, em outras palavras, do instável humor dos mercados.
 
Na explicação desse resultado tão ruim duas causas se combinam: o nível extremamente valorizado de nossa taxa de câmbio e a reversão da situação internacional. Com relação ao primeiro ponto, é preciso lembrar que, com exceção de poucos e muito curtos períodos, o valor de nossa moeda, justamente em virtude da vitória do discurso e das políticas econômicas de cunho neoliberal, tem ficado muito acima do razoável desde pelo menos 1994, ou seja, há mais de vinte anos. Isso teve e tem consequências drásticas para os resultados da balança de transações correntes. Se depois de 1999 — momento da maior crise cambial do país — esses resultados não tinham se apresentado com tamanha gravidade, isso ocorreu simplesmente pela existência de uma conjuntura internacional benfazeja, que não só puxava nossas vendas externas do ponto de vista quantitativo, como inflacionava em dólares os preços das commodities que o país majoritariamente exporta (o minério de ferro é o exemplo paradigmático), compensando assim a valorização do Real com os preços mais elevados em dólar dos produtos vendidos ao exterior. É essa conjuntura externa muito favorável que começa a se alterar depois da grande crise internacional do final de 2008, e que reverte de vez a partir de 2013.
 
Com essa inversão da conjuntura, à qual se associa agora a elevação das taxas de juros americanas, diminui a probabilidade de que apareçam os resultados necessários na Conta Financeira, apontando para um cenário de déficits globais no balanço de pagamentos nos próximos anos. É esse um dos fortes argumentos do discurso da austeridade no sentido da necessidade de “recuperar a credibilidade”, pois que, sem ela, esses movimentos de capital, que são autônomos e dependem dos humores do mercado, não se dariam na direção do país. Sem entrar no mérito da afirmação — que é discutível, visto supor que, nesses movimentos, o elemento determinante é sempre o interno — o que importa destacar é a necessidade imperiosa de que o país não mais dependa desses humores, ou seja, que se recupere o nível normal, em torno do equilíbrio, dos resultados das contas correntes.  Para tanto, o fator crucial é que se ponha fim à sobrevalorização cambial. Como o Brasil adota o regime de câmbio flutuante, em que o preço da divisa é ditado pelo mercado, torna-se necessário reforçar os mecanismos de controle dos fluxos de capital já existentes e criar novos, para que os humores do mercado não desestabilizem permanentemente esse preço e para que seja possível mantê-lo no nível correto do ponto de vista da necessária performance dos fluxos de renda e das exportações de bens e serviços.
 
A política de austeridade ora defendida não produzirá nenhum desses resultados, bem ao contrário. Em primeiro lugar a adoção de mecanismos de controle dos movimentos de capital é vista como algo que denigre a credibilidade do país, pois que ofende a sacrossanta liberdade dos fluxos financeiros. Além disso, se a recuperação da credibilidade, que viria na esteira da adoção das políticas de austeridade, implicar o recebimento de um volume ainda maior de recursos pela conta financeira, isso virá acompanhado inevitavelmente de uma reapreciação do valor de nossa moeda, prejudicando ainda mais a situação já quase insustentável dos déficits em transações correntes.               
 
Mas a situação recorrentemente apreciada do valor de nossa moeda teve e tem consequências drásticas também para o nosso outro problema, o da retomada do crescimento e da recuperação do nível de investimento. A relação Formação Bruta de Capital Fixo/PIB, ou seja, a proporção do produto que resulta de Investimentos, anda pela casa dos 17%, extremamente baixa para desencadear um processo de crescimento sustentado a médio e longo prazos (para se ter uma ideia, a mesma taxa na China anda pela casa dos 30%). É bem verdade, mais uma vez, que essa participação tem estado nesse nível baixo já há muito tempo, tendo sido raros, desde o início dos anos 1990, os momentos em que ultrapassou os 20%. A dificuldade agora, porém, está em que as variáveis alternativas que, ao longo dos últimos anos, foram substituindo os investimentos como fonte de demanda agregada e de crescimento econômico estão hoje todas comprometidas. Desde o segundo mandato de Lula, o crescimento veio se baseando numa espécie de roda que gira ao contrário, ou seja, primordialmente no consumo, estando esse, por sua vez, assentado na expansão do crédito. Ora, a expansão do crédito ao consumidor tem um limite natural na massa salarial e complica-se de vez quando as expectativas são de estagnação de salários e de nível de emprego. Com o crédito crescendo a taxas mais reduzidas, ou mesmo se reduzindo, o consumo, assentado nas mesmas variáveis também deixa de se expandir. A outra variável da demanda agregada que pôde funcionar como substituta do investimento foi a demanda externa líquida, em função da situação internacional anormalmente favorável ao país e que já se reverteu. Além disso, a apreciação continuada da nossa moeda foi inviabilizando, ao longo dos últimos 20 anos, inúmeros setores da indústria, o que acabou por reduzir estruturalmente as possibilidades de a demanda externa voltar a desempenhar esse papel.
 
Qual será o impacto das políticas de austeridade sobre o problema do crescimento e da necessária elevação do nível de investimentos da economia? Comecemos com estes últimos. Não é preciso muita argúcia para concluir que uma política que se baseia em elevação de juros e corte de gastos do governo, com consequente redução dos investimentos públicos, não pode funcionar como dinamizadora do nível de investimentos. Além disso, o próprio overshooting de apreciação pessimista, que faz parte da escandalosa campanha pela austeridade fiscal (terrorismo econômico, em suma), produz consequências funestas para as expectativas, que é a segunda principal variável, ao lado da taxa de juros, a determinar a disposição de investir.   
 
Se o investimento, que é a variável mais autônoma e mais dinâmica da demanda agregada, permanece reduzido, com tendência a ficar ainda mais deprimido, as possiblidades de as políticas de austeridade jogarem a favor da retomada do crescimento ficam comprometidas de per si.
 
Mas vejamos, de qualquer forma, que impacto elas poderiam ter sobre as outras variáveis. Do ponto de vista do consumo, uma política que corta gastos em programas sociais, que têm geralmente enorme efeito multiplicador, só fará reforçar a tendência de estagnação dessa variável, já complicada por força do elevado nível de endividamento das famílias. Além disso, as expectativas ruins para o próprio crescimento econômico, com as consequentes expectativas negativas para os níveis de emprego e salários reais, também ajudam a deprimir o consumo. No que tange à demanda externa, a política de juros elevados refreia a única tendência hoje favorável ao crescimento, que é a desvalorização da moeda brasileira, ora em curso. Esse movimento é o único que pode de alguma forma vir a compensar a reversão da situação internacional, fazendo com que a demanda externa volte a ganhar alguma proeminência como variável dinamizadora do crescimento. Portanto, desse ponto de vista, o sucesso das políticas de austeridade implicará a continuidade do desastre nas contas externas que vimos de acompanhar. Finalmente, os gastos do governo, que em si e por si deveriam poder funcionar como a variável de ajuste a compensar a tibieza do investimento e consumo privados, constituem justamente o objeto número um das tesouras afiadas, e cegas, do atual Ministério da Fazenda.
 
Como se percebe, não há a menor possibilidade de as políticas de austeridade virem a ter algum impacto positivo do ponto de vista do investimento e do crescimento. Como os próprios defensores dessas políticas sabem que é difícil demonstrar o contrário, a ideia de uma “freada de arrumação” torna-se necessária, pois ela faz crer que o remédio amargo de agora será sucedido rapidamente pelas benesses do pleno restabelecimento. O discurso é falacioso porque, com políticas desse tipo, a economia, já estagnada, entra num círculo vicioso de descenso cuja reversão pode levar muito tempo. O cenário é ainda mais desolador por força da complicada situação externa — volume de comércio em baixa, preços das commodities em baixa, elevação dos juros americanos, o que tende a tornar o movimento de descenso ainda mais forte e demorado. A estratégia de 2003, que agora se tenta repetir — remédio amargo no início, crescimento para depois, contou com uma conjuntura política muito menos complicada e com um cenário econômico internacional em ritmo veloz de crescimento.
 
A par da força dos mercados, sempre avassaladora quando encontra vassalagem, a tentativa de reproduzir o estratagema lulista sinaliza a fraqueza de um governo que, tão promissor em suas primícias, parece ter perdido o rumo da mudança. Quando até o FMI faz autocrítica das políticas ditas de austeridade, que mais dizer de tamanho recuo?
 
 
Leda Maria Paulani é Professora Titular do Departamento de Economia da FEA-USP


Créditos da foto: Marcelo Camargo / ABr





Amauri Spadari - 13/05/2015
O FATO é que "socam" goela abaixo do povo aumentos abusivos nas contas de luz, impostos, serviços públicos e tudo mais que é controlado pelas grandes corporações, e o salário achatadíssimo com a falsa inflação de 6,5%. VIVEMOS UM FASCISMO NACIONAL E GLOBAL!

José Arigo da Silva - 11/05/2015
Perfeita a conclusão, cara Profa. Leda Maria. O recuo é de uma crueldade e de uma falta de espinha(coluna vertebral) ímpares. Entretanto faço duas restrições ao seu texto, data venia, se me permite e salvo melhor juízo. 1.O recuo é a cara de Dilma. Não se poderia esperar outra coisa depois do primeiro governo dela. Que Dilma é tucano-neoliberal fica evidente pelos seus elogios a FHC e por outra medida cruel, desnecessária dela, tudo no primeiro governo: falo do seu "tremendo sucesso", com amplo apoio de congressistas, no começo do seu segundo ano, em FEV-2012: acabou com a aposentadoria integral dos servidores do regime jurídico único. Menos a dos militares, que continua. Retrocesso enorme.Fim de caminhada. Divisor de águas. Só não viu quem não quis. E poucos quiseram ver. Ora bolas, gastando 50% do orçamento com juros e só 10% com pessoal é muita covardia fazer o que ela fez. Com aplausos de Folha de S. Paulo em editorial e dos coveiros de sempre. Bate nessa ponto, minha ilustre Professora. 2. Meu segundo reparo de seu magnífico texto é algo controverso. Mas, me perdoe, pra mim, nossa moeda tem de valer o que vale o dólar, ou melhor, a moeda internacional de referência. Por que eu vou logo de saída dizer que diante do mundo eu posso comprar pouco? Por que eu vou onerar as importações que preciso fazer? Quem foi que disse que com minha moeda fraca meus exportadores ganham mais, se seus custos aumentam com o aumento da moeda internacional? E os meus cientistas, que ficam proibidos de comprar livros no exterior; de assinar revistas técnicas e tomar parte em associações internacionais, americanas e de outros países? Não, minha cara Professora, não é só com dólar alto que impeço a compra de porcarias e bugigangas no exterior. O tempora o mores.

Milton Campanario - 11/05/2015
Cara amiga Leda. A questão é a quebra de credibilidade de tal matriz alternativa do Guido/Dilma. Os preços administrados são mesmo administrados, mas não para afundar uma empresa como a Petrobrás. A contabilidade criativa e pedaladas expõem o governo a coisas como plataformas da petrolífera exportadas e uma saída de 42 bilhões para cobrir os serviços prestados por ela no exterior, sendo que ela está aqui. Ademais, tal matriz vai criar uma classe média por meio do consumo, sem um investimento sistemático em saneamento, educação e saúde, bens de consumo coletivo, o que deveria estar na base desta matriz. Não está. Não creio que esta arrumada nas contas irá ajudar pois o custo político e social é alto demais, para todo o país. Infelizmente, muito do que foi feito por esta matriz tinha cunho eleitoral e jogou a economia brasileira neste caos que espero ver superado, para o bem dos mais pobres. Seria o caso do Perceu Abramo publicar uma versão completa desta matriz pois como foi desenhada por Dilma e Guido não dá para confiar e ter um debate a altura. Há que ter componentes ditos liberais coo maior atração aos investimentos estrangeiros, quebra no conteúdo nacional e investimentos sociais. Boa sorte.

Milton Campanario - 09/05/2015
Minha querida colega Leda. Vejo que mais do que austeridade, a grande questão é a credibilidade abalada pela denominada "matriz econômica" criada pela dupla Dilma/Guido. Há duas alternativas de explicação: 1) Houve de fato uma falta de sensibilidade na implantação de tal matriz, calcada principalmente no gasto das famílias e do Governo, no emprego inflacionado do setor de serviços. Não houve atenção nos investimentos diretos (nacionais e estrangeiros) e o no comprometimento irresponsável frente as tarifas administradas; 2) A culpa é da crise externa e do PIG. Fico com a primeira. Há uma lenta mas segura recuperação dos números dos emergentes e mesmo dos países avançados, com o Brasil se descolando deste cenário. A outra questão é como colocar um ultra-liberal para comandar a economia em movimento oposto ao que foi defendido durante todo o ano passado. Triste cenário econômico e infeliz destino político.







A disputa pelo pré-sal

8/05/2015 - Copyleft
 Mauro Santayana
Mauro Santayana
A disputa pelo pré-sal
A Petrobrás, que acaba de ganhar o maior prêmio da indústria internacional de exploração de petróleo em águas marinhas, é novamente questionada no pré-sal.

Os jornais voltam a anunciar que se discute, dentro e fora do governo, o fim da atuação da Petrobrás como operadora exclusiva do pré-sal, com fatia mínima de 30%.

Alegam seus adversários, entre outras coisas, que seria inviável para a Petrobras continuar a explorar o petróleo do pré-sal com a baixa cotação atual do barril no mercado global, quando a produção oriunda dessa área cresceu 70% em março e se aproxima de 500 mil barris por dia.

Ora, se a Petrobrás, que acaba de ganhar (pela terceira vez) o maior prêmio da indústria internacional de exploração de petróleo em águas marinhas, o OTC Distinguished Achievement Award for Companies, Organizations and Institutions, nos EUA, justamente pelo desenvolvimento de tecnologia própria para a extração do óleo do pré-sal em condições extremas de profundidade e pressão, estaria tendo prejuízo na exploração desse óleo, porque as empresas estrangeiras, a quem se quer entregar o negócio, conseguiriam ter lucro como operadoras, se não dispõem da mesma tecnologia?

Se a Petrobras explora petróleo até nos Estados Unidos, em campos como Cascade, Chinook e Hadrian South, onde acaba de descobrir reservas de 700 milhões de barris, em águas territoriais norte-americanas do Golfo do México, porque tem competência para fazer isso, qual é a lógica de abandonar a operação do pré-sal em seu próprio país, onde pode gerar mais empregos e renda com a contratação de serviços e produtos locais, e o petróleo é de melhor qualidade?

A falta de sustentação dessa tese não consegue ocultar seus principais objetivos. Se quer aproveitar uma “crise” da qual a empresa sairá em poucos meses (as ações com direito a voto já se valorizaram 60% desde janeiro; o balanço foi apresentado com enormes provisões para perdas por desvios de R$ 6 bilhões, que delatores “premiados”, cuja palavra foi considerada sagrada em outros casos, já negaram que tenham ocorrido; a produção e as vendas estão em franco crescimento) para fazer com que o país recue no regime de partilha de produção, de conteúdo nacional mínimo, e na presença de uma empresa nacional na operação de todos os poços, para promover a entrega da maior reserva de petróleo descoberta neste século para empresas ocidentais, como a Exxon, por exemplo, que acaba de perder, justamente para a Petrobras, o título de maior produtora de petróleo do mundo de capital aberto.

Como ocorreu na década de 1990, se cria um clima de terror para promover a entrega de uma das últimas empresas sob controle nacional ao estrangeiro.

Enquanto isso não for possível, procura-se diminuir sua dimensão e importância, impedindo sua operação na exploração de reservas que são suas, por direito, situadas em uma área que ela descobriu, sozinha, graças ao desenvolvimento de tecnologia própria e inédita e à capacidade de realização da nossa gente.








A democracia, o financiamento empresarial e a corrupção

A nossa democracia não pode depender do dinheiro de bancos, empreiteiras e outras empresas. Não há democracia digna que possa nascer desse sistema.

14/05/2015 - Copyleft

Miguel Rossetto
Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
A Câmara Federal vai decidir novas regras para o nosso sistema político. Essa agenda é a mesma do Chile. Em abril, a presidente Michele Bachelet, apresentou ao Congresso o fim do financiamento empresarial, limite de doação para pessoas físicas, redução de gastos de campanha e reorganização dos partidos. No Chile, assim como no Brasil, essas propostas emergem em meio a escândalos de corrupção e instabilidade política.
 
O financiamento empresarial da política e a corrupção caminham juntos. Essa é a percepção da sociedade civil, encabeçada por CNBB, OAB, UNE e a CUT, que lutam pela proibição do financiamento empresarial de partidos e candidatos.
 
A promiscuidade entre o setor público e as empresas privadas tem sua origem nas campanhas eleitorais. O financiamento empresarial, além de estabelecer laços suspeitos entre financiadores e eleitos, limita o acesso dos que têm menor poder econômico, aumentando a distância entre os representantes e a sociedade. Sequestra uma das regras básicas da democracia – igualdade na disputa eleitoral – e corrói a transparência dos partidos.
 
A nossa democracia não pode depender do dinheiro de bancos, empreiteiras e outras empresas. Não há democracia digna que possa nascer desse sistema. Os aportes empresariais nas eleições brasileiras representam mais de 90% do que os partidos arrecadam; em 2014 ultrapassaram R$ 5 bilhões. Uma única empresa doou R$360 milhões! Se os parlamentares não mudarem radicalmente esse modelo não serão eliminadas as causas da corrupção que desvia recursos públicos que deviam ser investidos para melhorar a qualidade da saúde, da educação e da segurança.
 
A grave crise do sistema político exige posição clara. A reforma política deve enfrentar o mal pela raiz: proibir o financiamento empresarial de partidos e candidatos. Soaria estranho à sociedade que os congressistas não ponham fim a uma regra que favorece suas próprias eleições. Com campanhas mais baratas e representantes eleitos por compromissos e ideias e não por dinheiro, teremos uma democracia e uma República melhores para o Brasil.
 
Miguel Rossetto é Ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, foi vice-governador do estado do Rio Grande do Sul