terça-feira, 17 de março de 2015


17/03/2015 20h54 - Atualizado em 17/03/2015 20h54

Executivo relata à Justiça como eram as reuniões do 'clube' de empreiteiras

Gerson Almada, ex-presidente da Engevix, falou em audiência nesta terça.
Ele nega que houvesse acerto de preços, mas admite 'preferências'.

Fernando Castro e Samuel NunesDo G1 PR
Gerson de Mello Almada, da Engevix, explica importância do dirigível desenvolvido em São Carlos (Foto: Divulgação/Engevix)Gerson de Mello Almada depôs à Justiça nesta
terça-feira (17) (Foto: Divulgação/Engevix)
Em audiência realizada na Justiça Federal em Curitiba nesta terça-feira (17), o ex-vice-presidente da Engevix Gerson Almada detalhou ao juiz Sergio Moro o funcionamento do “clube” de empreiteiras que se reunia para tratar de licitações da Petrobras. Ele nega que houvesse acerto de preços, mas admite que as empreiteiras acertavam as “preferências” por cada obra de um pacote de licitações da estatal.
Segundo Almada, tudo ocorria no âmbito das empresas, sem que a estatal tivesse conhecimento do que era combinado. “A gente entrava numa rodovia chamada Petrobras que tinha os pedágios. Você está trafegando, você teria que estar pagando pedágio”, disse, para justificar a falta de interesse da estatal sobre quem venceria a licitação.
“Todas as empresas que prestam serviços, contribuíam para a Petrobras. Seja através de alguém, diretamente, ou em caixa dois. Cada uma tinha a sua forma de pagamento. O Alberto Youssef tinha vários contratos com outras empresas, semelhantes aos meus” relatou Almada. Conforme o executivo, as empresas também tinham que pagar para poder participar das concorrências.
Nas reuniões do clube, que em boa parte das vezes ocorria na sede da UTC, de acordo com Almada, eram apresentadas as obras e cada empresa poderia apontar até três preferências. Em caso de mais de uma empresa requisitar preferência sobre determinada obra, eram criados subgrupos para discussões específicas. Segundo Almada, por não haver combinação de preço, não se tratava de uma combinação de licitação. Segundo ele, a Engevix chegou a perder licitações em que tinha preferência, até mesmo para empresas de fora do clube.
Intermediários
Almada revelou que pagava a intermediários para manter “bom relacionamento” com a Petrobras. Os emissários eram o doleiro Alberto Youssef e o empresário Milton Pascowitch. Almada disse que ambos trabalhavam para que a Engevix “não tivesse problemas” nos contratos celebrados com a Petrobras. Eles ficavam com um percentual e até 1% dos contratos em que atuavam, e faziam a intermediação entre a Engevix e a Petrobras e as diretorias de Abastecimento e Serviços.
“Era um relacionamento que eu não tenho, que eu não poderia falar abertamente com o cliente. Isso é bom para os dois lados, o cliente também faz chegar alguns recados à empresa”, justificou.
Conforme o relato, Pascowitch era o responsável pelo relacionamento com a Petrobras e com o Partido dos Trabalhadores (PT). Ele relatou que o empresário o procurou depois que a Engevix havia firmado o primeiro contrato com a Petrobras, dizendo que a empresa precisaria “manter um relacionamento com o partido e com o cliente”.
Já Youssef era o elo com a Diretoria de Abastecimento da estatal, e com o Partido Progressista (PP). “Ele sempre colocava que precisava trabalhar em função do partido”, disse Almada. Ele nega, porém que tivesse conhecimento de que os pagamentos eram direcionados aos diretores e funcionários da Petrobras. “Eu pagava o valor para ter um relacionamento com esses diretores. Existe um poder econômico muito forte na Petrobras, uma pressão. O que se pagava era para não ser pressionado”, explicou.
Conforme o relato, Almada só soube que o dinheiro iria para funcionários da estatal em 2014, quando Youssef lhe cobrou valores devidos por serviços prestados em anos anteriores. Assim, a Engevix realizou pagamento à empresa Costa Global, de Paulo Roberto Costa, através de um contrato falso de consultoria. Sobre a participação de políticos, ele disse ter desconfiado logo quando conheceu Youssef, pois o doleiro se apresentou na presença do ex-deputado federal José Janene (PP).
Questionado sobre porque pagar o valor, uma vez que Paulo Roberto Costa já estava fora da Petrobras, Almada disse que Youssef havia lhe repassado a expectativa de que o PP pudesse indicar um novo diretor para a estatal, em breve. “O engenheiro Paulo Roberto Costa estaria agora trabalhando com o Youssef, desenvolvendo esse tipo de lobby”.
José Dirceu
Almada contou ainda que chegou a pagar ao ex-ministro José Dirceu valores entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão por serviços de consultoria. Os pagamentos, segundo Almada, foram feitos à empresa JD Consultoria para prospecção de negócios no Peru e em Cuba.
Conforme o relato, o trabalho de Dirceu seria apresentar a Engevix para investidores destes países. No entanto, nenhum negócio foi fechado, de forma que Dirceu deixou de receber comissões sobre possíveis contratos que seriam fechados. Após o relato, Moro levantou o sigilo sobre as investigações da JD Consultoria. “A licitude desses pagamentos está em apuração. Qualquer conclusão é prematura”, afirmou o juiz.
A assessoria do ex-ministro disse que, entre 2000 e 2014 foram atendidos cerca de 60 clientes de quase 20 setores da economia. Do total de R$ 29 milhões faturados pela consultora, 85% foram gastos com pagamentos de despesas e recolhimento de impostos, conforme a nota. A defesa informou ainda que entrou com mandado de segurança alegando que a quebra dos sigilos da empresa é ilegal.
Pedido de liberdade
Almada está preso na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba desde a deflagração da sétima etapa da Operação Lava Jato, há quatro meses. Depois da audiência desta terça, a defesa protocolou um pedido de revogação da prisão preventiva. Dentre as justificativas apresentadas está o fato de que o acusado veio a “confessar os fatos que a ele pertiniram no passado, de modo humilde e corajoso”.
A defesa de Almada sustenta ainda que os perigos alegados pelo Ministério Público Federal (MPF) para a prisão dele já não se justificam mais, uma vez que a Engevix já está proibida de contratar ou participar de licitações da Petrobras. Além disso, os advogados garantem que Almada não exerce mais nenhum cargo na empresa, desde que renunciou à vaga no Conselho de Administração em janeiro.
Descartam, também, a possibilidade de Almada atrapalhar o andamento do processo, já que se encerrou a etapa de instrução e houve a colaboração por parte do réu e dos defensores.



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